sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

O LODAÇAL DO PROPINODUTO TUCANO: A MÁFIA DOS TRENS EM SÃO PAULO SOB A MIRA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

Por: Prof. Dr. Rodrigo Medina Zagni

Foto: O LODAÇAL DO PROPINODUTO TUCANO:
A MÁFIA DOS TRENS EM SÃO PAULO SOB A MIRA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

Rodrigo Medina Zagni

O ano de 2013 foi marcado, no cenário político, pelo levante popular assistido durante as “jornadas de junho” e que tiveram início a partir da legítima reivindicação do “Movimento Passe-Livre” pela redução da tarifa do transporte público em São Paulo. Como um rastilho de pólvora, o movimento fez explodir descontentamentos que apresentaram aos poderes estabelecidos pautas muito mais extensas para além do falido sistema de transporte público nas grandes cidades brasileiras: a educação precarizada em todos os níveis, o sucateamento da saúde pública e a falta de médicos, a insegurança pública e tantos outros reclames que constituíram pautas difusas para contingentes bastante heterogêneos; mas que fizeram nas ruas cursos mais do que intensivos de formação política, enquanto governadores acuados moviam contra manifestantes e jornalistas o mais brutal da selvageria policial.
Os trinta centavos que levaram os primeiros manifestantes às ruas de São Paulo - motivo reiteradas vezes ridicularizado pela imprensa burguesa, por “profissionais da indignação” e por stand-up comedians da mídia televisiva – em verdade acompanhavam uma pauta bastante clara que refere o direito do povo à cidade, o que impõe centralidade à discussão sobre mobilidade urbana e o modelo de concessão para o setor privado de um serviço cuja natureza é essencialmente pública, o que nos leva à pergunta elementar: quem são os beneficiários das políticas públicas para o transporte urbano em São Paulo? São os usuários ou os megaempresários do setor? E isso vale para ônibus, trens e metrô, logo, implica tanto o governo municipal quanto estadual.
Enquanto prefeito, governador e até mesmo a presidenta faziam-se de sonsos dizendo não entender o que queriam os manifestantes, para os jovens pobres e em sua grande maioria negros nas periferias da cidade de São Paulo os motivos eram claríssimos: o constante remanejamento e exclusão de linhas, a substituição de pontos cobertos e com bancos por fálicos postes de sinalização, a espera de mais de uma hora por um ônibus em péssimas condições de manutenção, lotado e que comumente deixa seus usuários no meio do caminho, as estações de metrô superlotadas, os constantes problemas técnicos nas linhas, acidentes, o número insuficiente de trens, a insegurança nas composições e nas estações onde uma variedade surpreendente de crimes é registrada... Muitos são os motivos! O péssimo serviço ofertado pela aliança Estado/capital, em benefício do capital privado e em detrimento do interesse público chegou, em São Paulo, às vias do intolerável e o poder público teve que se deparar com um levante popular cuja magnitude não anteviu.
Mal tinham terminado as grandes manifestações (em menores proporções as manifestações seguem até hoje!), os motivos do sucateamento do transporte público em São Paulo, no que se refere ao metrô e trem, começaram a ser explicados a partir de denúncias que davam conta da existência de práticas de cartel das quais teria se beneficiado o tucanato paulista, que teria estimulado tais práticas segundo apuração preliminar do Ministério Público Estadual, bem como o superfaturamento de obras que teriam levado a prejuízos de quase 1 bilhão aos cofres públicos.
Por que a população de São Paulo sofre com um dos piores e mais caros transportes públicos do mundo? As práticas de corrupção constituem um elemento explicativo fulcral nesse processo.
Quando das primeiras denúncias de corrupção envolvendo nomes do PSDB e fraudes em licitações no Metrô de São Paulo, um silêncio sepulcral reinou na mídia hegemômica, evidenciando o poder de blindagem que gozavam os políticos tucanos. Não foram poucos os escândalos que envolveram governos do PSDB e que contaram com o silêncio leniente de uma imprensa engajada e sumamente ideológica (à direita, evidentemente!): as farras nas concessões de pedágios e rodovias (durante a gestão de Mário Covas), a venda do Banespa ao Santander, os escândalos da Nossa Caixa, da FURP, da compra de medicamentos a ambulâncias, o escândalo do “Rouboanel” (durante a gestão Alckmin), e por fim o “propinoduto do tucanato paulista”.
Passadas algumas semanas, dada a sucessão de documentos que começavam a ganhar as páginas de alguns veículos da mídia impressa e sobretudo por conta de as primeiras denúncias terem sido feitas na Suíça e na Alemanha (onde o PSDB não dispõe de blindagem alguma), os telejornais passaram a referir o escândalo de uma forma bastante peculiar, ao passo da espetacularização do julgamento dos mensaleiros do PT. Para os âncoras dos principais telejornais que passavam a fazer malabarismos linguísticos no uso de um novo vocabulário político, as denúncias de corrupção e superfaturamento de obras eram referidas apenas como “denúncias de suposto cartel”, seus articuladores, intimamente ligados à administração tucana não tinham nome, eram tão somente “funcionários públicos”, sequer José Serra e Geraldo Alckmin tinham nome, CPF e RG, eram pura e simplesmente “governo do Estado”. Ao cabo de toda e qualquer reportagem televisiva, a última palavra era dada pelo governador Geraldo Alckmin que insistia no mantra: “se houve cartel, o Estado é vítima!”
Tudo para não macular a imagem daqueles que se arvoravam paladinos da honestidade e da moral na política brasileira e que pretendiam ser os beneficiários diretos da condenação e encarceramento dos condenados do mensalão, com vistas ao pleito presidencial de 2014. No entanto, o projeto desvela-se, ao término do ano de 2013, inviável! Novas denúncias reascendem o escândalo do “propinoduto do tucanato paulista” com a possibilidade de terem sido desviados dos cofres públicos quase 1 bilhão de reais.
Novos fatos vieram à tona na capital paulista com a divulgação, na terça-feira do dia 3 de dezembro, do relatório elaborado pelo Ministério Público de São Paulo a partir de investigações feitas durante um ano e meio, com tomada de 30 oitivas e cujo objeto de apuração foi o gasto, por parte do Governo do Estado de São Paulo - durante as gestões de José Serra e de Geraldo Alckmin -, de 2,87 bilhões de reais (em valores não corrigidos) com a “modernização” - leia-se reforma -, de 98 trens usados com 6 vagões cada um, ou seja, 588 vagões que têm cerca de 35 anos de uso. De acordo com a revista “Carta Capital”, o valor gasto seria suficiente para comprar 136 vagões novos! Não apenas isso, em nenhum outro metrô no mundo reformou-se trens com quase 4 décadas de operação, tanto por questões de desempenho quanto de segurança: apenas em São Paulo e sob gestão tucana!
Foi desconsiderado ainda o fato de que se tivessem sido comprados novos trens (por valores muitíssimo próximos dos gastos com a “reforma”), as composições antigas não seriam descartadas; mas vendidas. Apesar de serem “sucata”, isso porque não poderiam ser aproveitados em outro sistema, trata-se de uma sucata valiosíssima. Conforme nos esclarece o “Portal Vermelho” cada vagão pesa cerca de 33 toneladas, sendo um quarto de placas de aço inoxidável, peças de cobre e componentes eletrônicos avaliados na cifra dos milhões.
Segundo o Ministério Público, os contratos firmados para a reforma dos trens seriam ilegais e apontariam para o superfaturamento de quase 1 bilhão de reais. A ilegalidade teria sido constatada em quatro contratos lavrados entre 2008 e 2011 (José Serra era governador entre 2007 e 2010) e cujo objeto era a reforma de 98 trens componentes das linhas “1-azul” e “3-vermelha” do metrô, conforme esclareceu Marcelo Milani, promotor de Defesa do Patrimônio Público de São Paulo. A estratégia que fez com que os contratos saltassem de 1,622 bilhão (seu valor inicial) para 2,87 bilhões de reais, envolveu o seu fracionamento ilegal em 10 contratos, do que resultou um acréscimo de ilícitos 875 milhões de reais.
Os usuários ainda estão sendo lesados por conta de a reforma tirar de circulação 36 trens, dos 98 que estão sendo reformados, que ficarão parados até o próximo ano; o que não aconteceria se tivessem sido adquiridas novas composições.
Contudo, as denúncias não se limitam apenas ao superfaturamento de quase 1 bilhão (o que já seria o suficiente para um escândalo de proporções imensuráveis, caso os envolvidos não fossem figuras proeminentes do tucanato paulista); mas às práticas de cartel – já confirmadas pelo promotor Marcelo Milani - que não têm apenas o Estado como vítima; mas seu governo diretamente implicado como réu, porquanto “incentivador” da montagem do cartel - de acordo com a revista “Isto É” (em reportagem escrita por Pedro Marcondes de Moura, Sérgio Pardellas e Alan Rodrigues) -, junto das empresas Alstom e Siemens, já investigadas em outras denúncias semelhantes e que envolvem também a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). 
De acordo com reportagem do jornal “O Estado de São Paulo” (sim, isso mesmo!), as irregularidades nos contratos firmados pelo Metrô envolveriam, além da Siemens e Alstom, a gigante Bombardier e outras empresas do ramo metroferroviário.
O que comprovaria a participação da gestão tucana no ilícito é o documento fornecido pelo engenheiro Nelson Branco Marchetti, ex-diretor técnico da divisão de transportes da empresa Siemens, no qual funcionário do alto escalão do Metrô convocava os diretores de transporte das Alstom e Siemens para uma reunião com dirigentes da CPTM e da Secretaria de Transportes Metropolitanos, a fim de comporem um consórcio que concorreria à licitação de um dos contratos. Esta secretaria era dirigida, à época, por José Luiz Portella, de acordo com a revista “Isto É”, Portelinha (como é conhecido) era o “braço direito de Serra”. 
Segundo o promotor Marcelo Milani, a licitação a que se referia a “convocatória” do Metrô, cujo contrato fora orçado em 708 milhões de reais e tratava do sistema de sinalização (CBTC) das linhas 1, 2 e 3 do Metrô, não teve competitividade, o que comprova a atuação do cartel que levou à vitória da Alstom, sozinha, para o fornecimento do CBTC às três linhas. 
O problema é que os “contratos de modernização” de trens não foram ganhos apenas sem disputa; mas a preços bem acima daqueles estabelecidos pelo Metrô de São Paulo e envolvendo o pagamento de propina a funcionários do governo, conforme denunciou o executivo austríaco Mark Willian Gough, vice-chefe do setor de compliance (setor que disciplina regras internas de conduta multinacional) da Siemens e que reside em Munique, em depoimento dado à Polícia Federal. Segundo reportagem da revista “Isto É”, o executivo da multinacional alemã denunciou ainda que uma das contas do ex-presidente da companhia no Brasil, Adilson Primo, no paraíso fiscal de Luxemburgo e que totaliza 7 milhões de dólares, estaria relacionada à propina. Ou seja, a obtenção de contratos com o governo paulista foi objeto de negociata, do que resulta a notável precarização do setor.
Segundo matéria publicada pela revista “Isto É”, “um dos fatos que chamaram a atenção do promotor Milani foi a falta de competitividade na licitação dos quatro lotes de veículos reformados. Cada um deles foi disputado por um único consórcio, que reunia uma ou mais empresas. Ao final, sagravam-se vencedores com propostas acima dos valores estabelecidos pelo Metrô em consulta de tomada de preço feita com as próprias empresas”.
A falta de concorrência já vinha sendo questionada desde 2012 quando Eduardo Bittencourt Carvalho, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, avaliou os contratos e questionou o Metrô paulista.
A fraude é também escancarada pelo fato de uma das empresas envolvidas na reforma dos trens de São Paulo ter fechado contrato, recentemente, com o metrô de Nova Iorque para o fornecimento de trens novos. Trata-se de 300 vagões vendidos a 600 milhões de dólares, equivalentes a 1,4 bilhões de reais; enquanto em São Paulo a reforma de 588 vagões custou aos cofres públicos (ou seja, dinheiro meu e seu!) módicos 2,87 bilhões! O que chamou a atenção do Ministério Público é o fato de os trens novos, vendidos ao metrô de Nova Iorque, terem preço semelhante à reforma dos trens paulistas cuja idade é de quase quatro décadas. 
O tucanato seria responsável ainda por três acidentes ocorridos nos últimos anos e que envolveram exatamente trens reformados a partir dos artifícios fraudulentos aqui descritos, demonstrando que os materiais e serviços prestados são de qualidade no mínimo questionável, além de o objeto da “modernização” (vagões com 35 anos de operação!) ser na verdade “sucata” segundo as autoridades que investigam o caso e ouvidas pela revista “Isto É”. Em 1º de dezembro de 2012 um trem se deslocou sozinho, vindo a colidir com outra composição, na Estação Jabaquara. No dia 16 de maio de 2013, dois trens colidiram na linha vermelha (a primeira colisão de trens da história da companhia!) resultando em três vítimas. No dia 5 de agosto de 2013, houve o descarrilamento de uma composição na linha vermelha, causado por um “problema” em uma das peças utilizadas na reforma. Nenhum dos eventos resultou em tragédia; mas o potencial era para tanto e se trens reformados por estas empresas - agraciadas por licitações fraudulentas e contratos superfaturados -, comprovando-se que materiais e serviços prestados seriam de qualidade inferior, envolverem-se em acidentes dos quais resulte a morte de usuários, o corrupto governo do Estado de São Paulo é diretamente responsável!
Em função disso, a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e Social de São Paulo enviou a Luiz Antônio Carvalho Pacheco, Presidente do Metrô, convocatória para que responda, em até 30 dias, recomendação administrativa para a suspensão dos 10 contratos que estão sendo investigados, todos em execução, dado o risco iminente que sofrem os usuários do Metrô.
Aqueles que foram tomados de surpresa com o ascenso revolucionário de junho certamente subestimaram a capacidade de indignação das classes subalternas na dura realidade brasileira; e seguem subestimando só que em escala muitas vezes maior! 
Desta vez a distância é aquela que permite diferir 30 centavos de 875 milhões, e vale muito a pena ocupar as ruas por isso!

O ano de 2013 foi marcado, no cenário político, pelo levante popular assistido durante as “jornadas de junho” e que tiveram início a partir da legítima reivindicação do “Movimento Passe-Livre” pela redução da tarifa do transporte público em São Paulo. Como um rastilho de pólvora, o movimento fez explodir descontentamentos que apresentaram aos poderes estabelecidos pautas muito mais extensas para além do falido sistema de transporte público nas grandes cidades brasileiras: a educação precarizada em todos os níveis, o sucateamento da saúde pública e a falta de médicos, a insegurança pública e tantos outros reclames que constituíram pautas difusas para contingentes bastante heterogêneos; mas que fizeram nas ruas cursos mais do que intensivos de formação política, enquanto governadores acuados moviam contra manifestantes e jornalistas o mais brutal da selvageria policial.

Os vinte centavos que levaram os primeiros manifestantes às ruas de São Paulo - motivo reiteradas vezes ridicularizado pela imprensa burguesa, por “profissionais da indignação” e por stand-up comedians da mídia televisiva – em verdade acompanhavam uma pauta bastante clara que refere o direito do povo à cidade, o que impõe centralidade à discussão sobre mobilidade urbana e o modelo de concessão para o setor privado de um serviço cuja natureza é essencialmente pública, o que nos leva à pergunta elementar: quem são os beneficiários das políticas públicas para o transporte urbano em São Paulo? São os usuários ou os megaempresários do setor? E isso vale para ônibus, trens e metrô, logo, implica tanto o governo municipal quanto estadual.

Enquanto prefeito, governador e até mesmo a presidenta faziam-se de sonsos dizendo não entender o que queriam os manifestantes, para os jovens pobres e em sua grande maioria negros nas periferias da cidade de São Paulo os motivos eram claríssimos: o constante remanejamento e exclusão de linhas, a substituição de pontos cobertos e com bancos por fálicos postes de sinalização, a espera de mais de uma hora por um ônibus em péssimas condições de manutenção, lotado e que comumente deixa seus usuários no meio do caminho, as estações de metrô superlotadas, os constantes problemas técnicos nas linhas, acidentes, o número insuficiente de trens, a insegurança nas composições e nas estações onde uma variedade surpreendente de crimes é registrada... Muitos são os motivos! O péssimo serviço ofertado pela aliança Estado/capital, em benefício do capital privado e em detrimento do interesse público chegou, em São Paulo, às vias do intolerável e o poder público teve que se deparar com um levante popular cuja magnitude não anteviu.Mal tinham terminado as grandes manifestações (em menores proporções as manifestações seguem até hoje!), os motivos do sucateamento do transporte público em São Paulo, no que se refere ao metrô e trem, começaram a ser explicados a partir de denúncias que davam conta da existência de práticas de cartel das quais teria se beneficiado o tucanato paulista, que teria estimulado tais práticas segundo apuração preliminar do Ministério Público Estadual, bem como o superfaturamento de obras que teriam levado a prejuízos de quase 1 bilhão aos cofres públicos.

Por que a população de São Paulo sofre com um dos piores e mais caros transportes públicos do mundo? As práticas de corrupção constituem um elemento explicativo fulcral nesse processo. Quando das primeiras denúncias de corrupção envolvendo nomes do PSDB e fraudes em licitações no Metrô de São Paulo, um silêncio sepulcral reinou na mídia hegemômica, evidenciando o poder de blindagem que gozavam os políticos tucanos. Não foram poucos os escândalos que envolveram governos do PSDB e que contaram com o silêncio leniente de uma imprensa engajada e sumamente ideológica (à direita, evidentemente!): as farras nas concessões de pedágios e rodovias (durante a gestão de Mário Covas), a venda do Banespa ao Santander, os escândalos da Nossa Caixa, da FURP, da compra de medicamentos a ambulâncias, o escândalo do “Rouboanel” (durante a gestão Alckmin), e por fim o “propinoduto do tucanato paulista”.
Passadas algumas semanas, dada a sucessão de documentos que começavam a ganhar as páginas de alguns veículos da mídia impressa e sobretudo por conta de as primeiras denúncias terem sido feitas na Suíça e na Alemanha (onde o PSDB não dispõe de blindagem alguma), os telejornais passaram a referir o escândalo de uma forma bastante peculiar, ao passo da espetacularização do julgamento dos mensaleiros do PT. Para os âncoras dos principais telejornais que passavam a fazer malabarismos linguísticos no uso de um novo vocabulário político, as denúncias de corrupção e superfaturamento de obras eram referidas apenas como “denúncias de suposto cartel”, seus articuladores, intimamente ligados à administração tucana não tinham nome, eram tão somente “funcionários públicos”, sequer José Serra e Geraldo Alckmin tinham nome, CPF e RG, eram pura e simplesmente “governo do Estado”. Ao cabo de toda e qualquer reportagem televisiva, a última palavra era dada pelo governador Geraldo Alckmin que insistia no mantra: “se houve cartel, o Estado é vítima!”

Tudo para não macular a imagem daqueles que se arvoravam paladinos da honestidade e da moral na política brasileira e que pretendiam ser os beneficiários diretos da condenação e encarceramento dos condenados do mensalão, com vistas ao pleito presidencial de 2014. No entanto, o projeto desvela-se, ao término do ano de 2013, inviável! Novas denúncias reascendem o escândalo do “propinoduto do tucanato paulista” com a possibilidade de terem sido desviados dos cofres públicos quase 1 bilhão de reais.
Novos fatos vieram à tona na capital paulista com a divulgação, na terça-feira do dia 3 de dezembro, do relatório elaborado pelo Ministério Público de São Paulo a partir de investigações feitas durante um ano e meio, com tomada de 30 oitivas e cujo objeto de apuração foi o gasto, por parte do Governo do Estado de São Paulo - durante as gestões de José Serra e de Geraldo Alckmin -, de 2,87 bilhões de reais (em valores não corrigidos) com a “modernização” - leia-se reforma -, de 98 trens usados com 6 vagões cada um, ou seja, 588 vagões que têm cerca de 35 anos de uso. De acordo com a revista “Carta Capital”, o valor gasto seria suficiente para comprar 136 vagões novos! Não apenas isso, em nenhum outro metrô no mundo reformou-se trens com quase 4 décadas de operação, tanto por questões de desempenho quanto de segurança: apenas em São Paulo e sob gestão tucana!
Foi desconsiderado ainda o fato de que se tivessem sido comprados novos trens (por valores muitíssimo próximos dos gastos com a “reforma”), as composições antigas não seriam descartadas; mas vendidas. Apesar de serem “sucata”, isso porque não poderiam ser aproveitados em outro sistema, trata-se de uma sucata valiosíssima. Conforme nos esclarece o “Portal Vermelho” cada vagão pesa cerca de 33 toneladas, sendo um quarto de placas de aço inoxidável, peças de cobre e componentes eletrônicos avaliados na cifra dos milhões.

Segundo o Ministério Público, os contratos firmados para a reforma dos trens seriam ilegais e apontariam para o superfaturamento de quase 1 bilhão de reais. A ilegalidade teria sido constatada em quatro contratos lavrados entre 2008 e 2011 (José Serra era governador entre 2007 e 2010) e cujo objeto era a reforma de 98 trens componentes das linhas “1-azul” e “3-vermelha” do metrô, conforme esclareceu Marcelo Milani, promotor de Defesa do Patrimônio Público de São Paulo. A estratégia que fez com que os contratos saltassem de 1,622 bilhão (seu valor inicial) para 2,87 bilhões de reais, envolveu o seu fracionamento ilegal em 10 contratos, do que resultou um acréscimo de ilícitos 875 milhões de reais.
Os usuários ainda estão sendo lesados por conta de a reforma tirar de circulação 36 trens, dos 98 que estão sendo reformados, que ficarão parados até o próximo ano; o que não aconteceria se tivessem sido adquiridas novas composições.

Contudo, as denúncias não se limitam apenas ao superfaturamento de quase 1 bilhão (o que já seria o suficiente para um escândalo de proporções imensuráveis, caso os envolvidos não fossem figuras proeminentes do tucanato paulista); mas às práticas de cartel – já confirmadas pelo promotor Marcelo Milani - que não têm apenas o Estado como vítima; mas seu governo diretamente implicado como réu, porquanto “incentivador” da montagem do cartel - de acordo com a revista “Isto É” (em reportagem escrita por Pedro Marcondes de Moura, Sérgio Pardellas e Alan Rodrigues) -, junto das empresas Alstom e Siemens, já investigadas em outras denúncias semelhantes e que envolvem também a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). 
De acordo com reportagem do jornal “O Estado de São Paulo” (sim, isso mesmo!), as irregularidades nos contratos firmados pelo Metrô envolveriam, além da Siemens e Alstom, a gigante Bombardier e outras empresas do ramo metroferroviário.

O que comprovaria a participação da gestão tucana no ilícito é o documento fornecido pelo engenheiro Nelson Branco Marchetti, ex-diretor técnico da divisão de transportes da empresa Siemens, no qual funcionário do alto escalão do Metrô convocava os diretores de transporte das Alstom e Siemens para uma reunião com dirigentes da CPTM e da Secretaria de Transportes Metropolitanos, a fim de comporem um consórcio que concorreria à licitação de um dos contratos. Esta secretaria era dirigida, à época, por José Luiz Portella, de acordo com a revista “Isto É”, Portelinha (como é conhecido) era o “braço direito de Serra”. 
Segundo o promotor Marcelo Milani, a licitação a que se referia a “convocatória” do Metrô, cujo contrato fora orçado em 708 milhões de reais e tratava do sistema de sinalização (CBTC) das linhas 1, 2 e 3 do Metrô, não teve competitividade, o que comprova a atuação do cartel que levou à vitória da Alstom, sozinha, para o fornecimento do CBTC às três linhas. 
O problema é que os “contratos de modernização” de trens não foram ganhos apenas sem disputa; mas a preços bem acima daqueles estabelecidos pelo Metrô de São Paulo e envolvendo o pagamento de propina a funcionários do governo, conforme denunciou o executivo austríaco Mark Willian Gough, vice-chefe do setor de compliance (setor que disciplina regras internas de conduta multinacional) da Siemens e que reside em Munique, em depoimento dado à Polícia Federal. Segundo reportagem da revista “Isto É”, o executivo da multinacional alemã denunciou ainda que uma das contas do ex-presidente da companhia no Brasil, Adilson Primo, no paraíso fiscal de Luxemburgo e que totaliza 7 milhões de dólares, estaria relacionada à propina. Ou seja, a obtenção de contratos com o governo paulista foi objeto de negociata, do que resulta a notável precarização do setor.

Segundo matéria publicada pela revista “Isto É”, “um dos fatos que chamaram a atenção do promotor Milani foi a falta de competitividade na licitação dos quatro lotes de veículos reformados. Cada um deles foi disputado por um único consórcio, que reunia uma ou mais empresas. Ao final, sagravam-se vencedores com propostas acima dos valores estabelecidos pelo Metrô em consulta de tomada de preço feita com as próprias empresas”.
A falta de concorrência já vinha sendo questionada desde 2012 quando Eduardo Bittencourt Carvalho, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, avaliou os contratos e questionou o Metrô paulista.

A fraude é também escancarada pelo fato de uma das empresas envolvidas na reforma dos trens de São Paulo ter fechado contrato, recentemente, com o metrô de Nova Iorque para o fornecimento de trens novos. Trata-se de 300 vagões vendidos a 600 milhões de dólares, equivalentes a 1,4 bilhões de reais; enquanto em São Paulo a reforma de 588 vagões custou aos cofres públicos (ou seja, dinheiro meu e seu!) módicos 2,87 bilhões! O que chamou a atenção do Ministério Público é o fato de os trens novos, vendidos ao metrô de Nova Iorque, terem preço semelhante à reforma dos trens paulistas cuja idade é de quase quatro décadas. 
O tucanato seria responsável ainda por três acidentes ocorridos nos últimos anos e que envolveram exatamente trens reformados a partir dos artifícios fraudulentos aqui descritos, demonstrando que os materiais e serviços prestados são de qualidade no mínimo questionável, além de o objeto da “modernização” (vagões com 35 anos de operação!) ser na verdade “sucata” segundo as autoridades que investigam o caso e ouvidas pela revista “Isto É”. Em 1º de dezembro de 2012 um trem se deslocou sozinho, vindo a colidir com outra composição, na Estação Jabaquara. No dia 16 de maio de 2013, dois trens colidiram na linha vermelha (a primeira colisão de trens da história da companhia!) resultando em três vítimas. No dia 5 de agosto de 2013, houve o descarrilamento de uma composição na linha vermelha, causado por um “problema” em uma das peças utilizadas na reforma. Nenhum dos eventos resultou em tragédia; mas o potencial era para tanto e se trens reformados por estas empresas - agraciadas por licitações fraudulentas e contratos superfaturados -, comprovando-se que materiais e serviços prestados seriam de qualidade inferior, envolverem-se em acidentes dos quais resulte a morte de usuários, o corrupto governo do Estado de São Paulo é diretamente responsável!
Em função disso, a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e Social de São Paulo enviou a Luiz Antônio Carvalho Pacheco, Presidente do Metrô, convocatória para que responda, em até 30 dias, recomendação administrativa para a suspensão dos 10 contratos que estão sendo investigados, todos em execução, dado o risco iminente que sofrem os usuários do Metrô.
Aqueles que foram tomados de surpresa com o ascenso revolucionário de junho certamente subestimaram a capacidade de indignação das classes subalternas na dura realidade brasileira; e seguem subestimando só que em escala muitas vezes maior! 
Desta vez a distância é aquela que permite diferir 30 centavos de 875 milhões, e vale muito a pena ocupar as ruas por isso!

Rodrigo Medina Zagni é professor do curso de Relações Internacionais da Unifesp.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

O ocaso de Lobão: pseudo-intelectualidade, paranóia reacionária e mitomania no centro do Roda-Viva:

Por: Profº Dr. Rodrigo Medina Zagni

Nesta segunda-feira, 2 de dezembro de 2013, o programa Roda Viva recebeu Lobão – ex-músico, polemista profissional, militante político de direita e colunista da Veja (esta última ocupação que, por si só, explica os outros dois ofícios!). Há cerca de dez anos, noticiar algo do tipo significaria claramente a ocorrência de um acalorado debate dada a tradição histórica desse importantíssimo programa da televisão brasileira; mas isso há dez anos! As coisas mudaram, e muito! O programa que já teve a frente nomes como Heródoto Barbeiro e Paulo Markun é conduzido hoje por Augusto Nunes, também colunista da Veja, hábil em socorrer seus pares em momentos de notório constrangimento e fiel obediente ao repertório ideológico deste segmento da mídia hegemônica que demoliu a histórica tradição crítica do programa que se esfacela junto de sua nave-mãe: a TV Cultura, entregue às estratégias do mercado televisivo.

Já no início da entrevista os termos são apresentados de forma bastante direta; para o confuso, vago e obtuso entrevistado a realidade é simples e se expressa da seguinte forma: enquanto ele “fala a verdade”, todos aqueles que dele discordam são “idiotas”, de Mano Brown – do grupo “Racionais MC’s” e para quem Lobão “age como uma puta para vender livros” - a Pablo Capilé, do coletivo “Fora do Eixo”. Lugar cômodo dos egóicos que não sabem lidar com a discordância, comum às sociedades plurais onde o confronto dialético de ideias é que produz um tipo vivo de conhecimento, não os monolitos – na forma de dogmas políticos e ideológicos -, com os quais Lobão interpreta toscamente um mundo complexo. Dada incapacidade, que beira a psicopatia, é que permite a produção de fenômenos de massa como o fascismo, doutrina que tem em Lobão um terno simpatizante.
O autor do livro “Manifesto do Nada na Terra do Nunca” (obra na qual um dos capítulos é dedicado a homenagem às posturas políticas de Nelson Rodrigues!), com ar blasée, confunde cronologias (dos momentos que antecederam o golpe de 1964) e até mesmo personagens históricos (confunde, por exemplo, Jânio com Jango!) a fim de desmoralizar governos como o de João Goulart que, no universo fantasioso que criou para si, articulava um golpe cubanizador do Estado brasileiro, “ameaça comunista” da qual teríamos sido salvos pelo que chamou de “Revolução de 1964” (designação comumente dada pelos militares para caracterizar o golpe que instaurou o regime que se estendeu de 1964 a 1985). Esclareço: o golpe civil-militar que empodeirou o mais truculento regime de exceção e que por meio da violência política (o que inclui torturas, estupros, desaparecimentos forçados e o morticínio da dissidência política) tratorou liberdades democráticas por longos e sangrentos 21 anos.
Chega a defender o golpe afirmando que, graças a ele nos safamos de “algo muito pior”, referindo-se aos regimes cubano, soviético e venezuelano, como se tivessem sido, na história, três experiências idênticas. Defensor ou crítico dessas três experiências gravissimamente distintas, qualquer indivíduo são escaparia a este entendimento grosseiro, por quantos pontos de contato pudessem ser identificados, isso porque as rasuras são imensas.
Na sua paranoia reacionária, João Goulart não foi deposto: ele fugiu! Como se o Senador Auro Soares de Moura Andrade, que presidiu a sessão de 1º de abril de 1964 declarando vaga a presidência da república com o presidente João Goulart em território nacional, não tivesse com isso dado início ao golpe na sua fase parlamentar (sim, foi assim que o golpe começou: como golpe civil!). Resistir ao golpe, ainda que apoiado por Leonel Brizola e pelas forças comandadas pelo general Ladário Telles a partir do Rio Grande do Sul, para onde se dirigiu Jango já no dia 2 de abril, significaria o inicio de uma guerra civil que não teria rápido desfecho.
“Por que ele não ficou?”, indaga Lobão como se fosse um aluno do pré-primário: o exílio no Uruguai foi o preço pago por Jango para que sua deposição não resultasse em derramamento de sangue. Enquanto na madrugada do dia 31 as tropas lideradas pelo General Olímpio Mourão Filho se deslocavam de Minas Gerais para o Rio de Janeiro, a Marinha dos EUA, a frente da Operação Brother Sam, preparava-se para agir em prol dos militares em caso de guerra civil disponibilizando um porta-aviões, um encouraçado, um navio de transporte de tropas, um navio de transporte de helicópteros (com 50 unidades embarcadas), 25 aviões para transporte de armas, uma esquadrilha completa de aviação de caça e 100 toneladas de armas leves e munições. É o suficiente para dirimir-lhe a dúvida?
Constrangedor, até mesmo para os entrevistadores e para Augusto Nunes, que a todo tempo tinha que socorrê-lo a fim de evitar que as bobagens ditas fossem ainda mais exploradas pela bancada notadamente perplexa com o festival de sandices, dentre as quais sublinho a pérola de que a liberalização da maconha no Equador estaria sendo posposta para o fortalecimento das FARC’s, na Colômbia! Apesar de entender de substâncias entorpecentes, é notório o desconhecimento de Lobão acerca de uma economia política do tráfico internacional, tampouco da política interamericana e dos movimentos de luta armada que abriga.
Some-se a isso a informação de que a luta armada contra a ditadura, no Brasil, matava crianças! Imagino que aos montes! Talvez as tenham comigo, como fizeram os comunistas soviéticos!
No entanto, ele que se classifica como “ex-petista” não se diz de direita. Aliás, Lobão tem um notório problema de auto referência; alvo de baterias de latadas e garrafadas no Rock in Rio, o megalômano cantor declara-se o inventor da cena independente da música brasileira enquanto o que fez, pura e simplesmente, foi criar uma revista que trazia, como brinde, um CD! Mas Lobão não é de direita, segundo ele mesmo diz! Favorável ao golpe de 1964, para quem Marighella, Lamarca e Che foram assassinos e “sórdidos psicopatas”, contrário à política de cotas raciais, contrário ao “programa Mais Médicos”, contrário aos programas sociais focados na redução da pobreza, contrário à meia-entrada para estudantes, para quem os protestos populares acabam com seu direito de ir e vir, defensor fervoroso do capitalismo (o que inclui, suponho, suas contradições e desigualdades), contrário ao que chama de “ditadura do politicamente correto” (que impede pessoas de exercerem a liberdade de serem racistas, homofóbicas, xenofóbicas, defenderem o bullying, de serem intolerantes, por exemplo) etc. 
Notória confusão doutrinária ou incapacidade de ver a si mesmo para além da região do umbigo? 
Ah, sei... Lobão é neutro, tal qual a Veja...
A propósito, para seu mais novo colega de ofício na revista, Rodrigo Constantino, blogueiro-colunista para quem uma “... praga marxista se espalha pelo mundo”, Lobão se saiu muito bem, apesar das “... armadilhas de esquerdistas infiltrados ali para estragar uma entrevista séria” seu discurso revelara notável “independência crítica”! Entrevista séria? Esquerdistas infiltrados? Independência crítica? Não há absolutamente nenhuma independência crítica naquilo que diz, alinha-se exatamente pela unicidade do discurso adaptando-se facilmente ao seu novo ambiente de trabalho.
Mas sou obrigado, enfim, a concordar com meu xará: “o que vimos mostra bem a falência intelectual do Brasil”. 
Na verdade, pseudo-intelectual!

Rodrigo Medina Zagni é professor de História das Relações Internacionais da UNIFESP e membro do Grupo de Estudos "Conflitos armados, massacres e genocídios na era contemporânea" da USP. Tem artigos publicados em diversos livros e participa de debates e entrevistas sobre o tema. 

domingo, 24 de novembro de 2013

Eleitor ou consumidor?

Nos dias atuais, pode-se considerar que os indivíduos sejam ambos, tanto um eleitor, quanto um consumidor. 
Antigamente, para que fossem eleitos, os políticos ofereciam e davam coisas que as pessoas consumissem ou utilizassem, em troca de votos, transformando o eleitor em consumidor também. Hoje em dia, não é muito diferente, pois muitas vezes, acaba ocorrendo o mesmo. Os politicos "compram" os votos das pessoas, principalmente da população mais carente, oferecendo a elas coisas básicas para seu cotidiano, como por exemplo, cestas básicas. 
Como essas pessoas não são tão instruídas ou informadas, acabam acreditando nas promessas desses políticos e dando seus votos a eles. É através desse tipo de coisa, que muitos acabam se elegendo e depois de eleitos, acabam por deixar o povo que os elegeu "na mão", tendo comprado-os e usado-os para se elegerem.
Eis uma questão difícil, pois não sabemos se o eleitor vota para ter um país melhor e beneficiado ou apenas vota para ganhar algo. Existem muitos eleitores que vendem seus votos, assim, ganham benefícios para si mesmos e esse deve ser chamado de consumidor, pois vive do dinheiro ou do beneficio dado pelo politico. Mas, há pessoas que votam porque são eleitoras e não querem beneficio próprio e sim para todos.

Adriana e Wladimir Araújo.

Ambos sãos alunos do 2º ano A da E.E. Charles de Gaulle, ela se interessa por moda e sonha em ser modelista; ele, faz curso técnico em Edificações. O Ensino Médio é levado bem a sério, pois o objetivo dos dois é cursar uma faculdade. São colegas de classe que tem pouco contato, mas conseguiram elaborar uma opinião complementar, que merece ser publicada.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Bossa Nova: o mínimo que se tornou o máximo


O ano era 1958, a cidade era uma das mais lindas do país, ou seja, o Rio de Janeiro. Entre paisagens, mar, céu azul, moças bonitas, surge um novo movimento musical, que revolucionou o final da década de 50 do século XX e impulsionou até mesmo outros movimentos. 
A bossa nova, muito mais que uma nova música, continha um elemento a mais: o minimalismo. Ao invés de grandes orquestras e grandes apresentações musicais, propunha tocar a alma das pessoas, com apenas um banquinho e um violão. 
Consistiu num projeto ousado, amplamente estudado pelo maestro Antonio Carlos Jobim, o Tom, que em seus estudos, viu a possibilidade de fazer o samba de um jeito completamente diferente. Apesar de a música Chega de Saudade marcar de fato a explosão e a inauguração desse novo estilo, quando gravada por João Gilberto, a bossa nova já se fazia presente antes, com a gravação de Desafinado, uma música que ilustra bem a ideia de Tom Jobim: 

Se você insiste em classificar
Meus comportamento de anti-musical
Eu mesmo mentindo devo argumentar
Que isto é Bossa Nova, isto é muito natural

O fato, é que a voz pequena de João Gilberto ao cantar Chega de Saudade, fez explodir pelo país o encantamento por aquela nova música, que no seu mínimo, era o máximo. Símbolo de um país que estava tentando progredir, muito rapidamente, seja pela construção de Brasília, seja pela abertura das rodovias, até o presidente, Juscelino Kubstchek, ganhou o sugestivo apelido de presidente bossa nova.
Essa referência, além de simpática, também se encaixava perfeitamente, posto que um antigo diplomata brasileiro (além de poeta, boêmio, apaixonado por mulheres e cheio de casamentos) Vinicius de Moraes, também fazia parte das primeiras composições da bossa nova. Amigo pessoal do maestro, o poeta compôs musicas que se tornariam clássicas, não apenas nesse movimento, mas na própria história da MPB, quem não se encanta quando ouve Garota de Ipanema, por exemplo?

Tom e Vinicius - percursores da Bossa Nova.
A bossa nova inspirou músicos, cantores e compositores, mesmo quem mais tarde não teria identificação alguma com esse estilo musical, relatou seu encanto pela música, a partir dele. Caetano Veloso e Gilberto Gil, por exemplo, foram despertados para a carreira musical ao ouvir João Gilberto cantar, a quilômetros de distancia, na Bahia, conforme Caetano mesmo relatou em seu livro Verdade Tropical. Além deles, Maria Bethânia e Gal Costa também se encantaram. E não só eles, até Tim Maia quis ser bossa novista, mas com seu vozeirão, acabou indo para uma carreira mais dançante. Roberto Carlos é outro cantor que também quis fazer o som pequenininho. 
Há 5 anos, a Bossa Nova completou seu cinquentenário e na ocasião, foi celebrada com uma serie de eventos e homenagens. Contudo, a medida que o tempo passa, essa música tem se mostrado muito mais encantadora, do que velha senhora. 

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Considerações a respeito do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil:


Hoje escrevo para registrar minhas impressões a cerca da leitura do livro Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, do jornalista Leandro Narloch. Nele, o autor trata de assuntos polêmicos da História e da historiografia brasileiras, citando fontes inclusive. Contudo, vale ressaltar que trata-se de um livro de História sem ser historiografia.
Como um romance, é delicioso de ler. Faz pensar, provoca o leitor a querer pesquisar os temas e o melhor: a repensar a maneira como ensina História na escola. Produz um mergulho de quem lê no tempo em que os temas aconteceram.
Desperta-nos a entender os períodos históricos com base no tempo em que as histórias ocorreram e não com os julgamentos (e pré-julgamentos da contemporaneidade). De fato, a que se analisar os acontecimentos, com base em documentos que nos deem pistas que nos levem a uma compreensão embasada, cônscios de que a verdade deve ser perseguida e dificilmente encontrada em sua totalidade.
Na leitura, fica claro que o autor tem uma visão nada esquerdista da História (o que para muitos pode ser quase um crime, posto que aqui a influencia marxista predomina), mas isso não é um defeito da obra e sim um estimulo a mais, pois torna mais interessante o debate. Confrontar as idéias também desenvolve grandemente quem se propõe a estudar um tema.
Por fim, recomendo a leitura para que possam repensar temas polêmicos como a questão indígena, a escravidão e o segundo reinado, por exemplo. A partir dessa leitura, é importante repensar e porque não voltar a se interessar por determinados temas? E isso o autor nos instiga a fazer grandemente.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Um pouco de poesia:

CURSOR 

O inexplicável ardor do peito
E sofrimento eterno da alma
Destrói o homem pálido dos mundos vários,
Com intuito e precisão
De arquitetar a perfeição sonhadora e real.
O homem chora, no piso baixo,
Da sacada escondida, em balanço eterno,
Sob inferno de culpas muitas
Das falsas palavras
Coniventes com o desentendido,
Subjugado ele pela fraqueza
... muitas fraquezas.
Do eixo de desventuras, passados o pingar das tribulações,
Eis o novo homem
O sonho prevalecido
De uma guerra eterna
Ao Céu encantado
De verdades, amores e realizações.
Tudo em conformidade com a sequência da vida
Já descrita pelos lábios de Deus,
Registradas ao curso das reações e efeitos
De cada decisão. 

Matias Andrade

Matias Andrade é o pseudônimo de Matheus Nunes, aluno do 3º ano A do Ensino Médio da E.E. Charles de Gaulle. Apaixonado por Arquitetura, Matheus se dedica aos estudos com o objetivo de conquistar uma vaga no vestibular da FUVEST. Essa poesia foi composta para participar do "Concurso Poesia 2013" promovido pela Universidade São Judas.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Políticas docentes no Brasil, um documento escrito a seis mãos:


Em setembro de 2011, foi elaborado um documento da Unesco  e do MEC, a respeito das políticas docentes no Brasil, as autoras, Bernadete Angelina Gatti, Elba Siqueira de Sá e Marli Elza Damazo de Afonso André, especialistas em educação, traçaram o perfil docente através das políticas públicas desenvolvidas no país. 
Elas iniciam o texto mostrando o quanto é importante essa área para a sociedade. As pessoas, de um modo geral, a valorizam e a enxergam como sendo de suma importância. Contudo, a maneira como os governos a encaram é que demonstra o valor que de fato um país (em toda a sua divisão política) dá a ela. Isso, porque analisando como se implementam suas políticas, seu financiamento, seu gerenciamento, etc tem-se a exata noção se essa área é de fato valorizada. Elas mostram o conceito de "governos da educação", utilizado por Tedesco em 2010, para tratar do modo como os governos tem tratado a Educação, em alguns casos, a utilizando como marca de governo. Adiante, as autoras refletem se há de fato uma integração entre as politicas educacionais em todas as suas esferas (federal, estadual e municipal). 
Há uma reflexão sobre o caráter democrático dos governos latino americanos, que recém-saídos de ditaduras, mesmo na democracia não atingiram o grau de maturidade necessário para lidar com as questões educacionais. Muitos continuam com estruturas muito semelhantes aos velhos tempos.
Diante dessas questões (e de muitas outras que são analisadas em gráficos e tabelas), as autoras lançam o olhar sobre o professor. Profissional de extrema relevância na condução da instrução da sociedade, tem sido tido dificuldades na formação inicial, na continuada, recebendo baixos salários e tendo planos de carreira nada estimulantes muitas vezes. Isso tem se refletindo na procura de muitos em se especializar na área da Educação, tendo o professor como objeto de investigação.
Especificamente a respeito da docência, as autoras citam autores europeus que analisam essas questões em seu continente, chamando a atenção para os aspecto sócio-políticos e históricos. Todos eles falam da necessidade de se atrair, capacitar e conservar docentes eficientes. O que esses estudiosos demonstram que a carreira docente:

  1. tem atraído muito poucos talentos, já que tem se mostrado uma carreira pouco atrativa;
  2. diversos países tem diminuído seus investimentos na área;
  3. necessidade de proporcionar formação continuada;
  4. melhoria nos critérios de seleção desses profissionais;
  5. apoio aos ingressantes na carreira.


Por outro lado, esses mesmos estudiosos citados pelas autoras, apontam como caminhos adotados por esses mesmos países europeus, a preocupação com a qualidade e não com a quantidade na Educação. Para que isso ocorra, é preciso melhorar os critérios de seleção de professores, tanto no ingresso, como ao longo da carreira, promovendo formação e avaliação continuas, para tanto, é necessário que o professor tenha um novo perfil, que se adeque ao trabalho em equipe, tenha mais conhecimento pedagógico, e, sobretudo, tenha uma escola mais autônoma e descentralizada do professorado à gestão. Para se atingir tal objetivo, é necessário:

  1. estudar as novas competências que o professorado deve adquirir na sociedade atual.
  2. tornar a profissão mais atrativa, seja na entrada, seja no seu percurso, para reduzir a escassez de professores em muitos países (melhorar o salário, a imagem e o prestígio social, a carga de trabalho, a segurança no trabalho e a carreira).
  3. tornar a instituição educativa mais autônoma, mais responsável pela sua gestão pedagógica,  organizativa e de pessoal.


Voltando à analise da América Latina, estudiosos afirmam que no continente:


  1. estudar as novas competências que o professorado deve adquirir na sociedade atual.
  2. tornar a profissão mais atrativa, seja na entrada, seja no seu percurso, para reduzir a escassez de professores em muitos países (melhorar o salário, a imagem e o prestígio social, a carga de trabalho, a segurança no trabalho e a carreira).
  3. tornar a instituição educativa mais autônoma, mais responsável pela sua gestão pedagógica, organizativa e de pessoal.

Nesse caso, os motivos apontados estão no fato de o magistério ser uma carreira mais voltada às mulheres. O que faz com que muitos governos latino-americanos a desprezem. Acrescenta-se a isso, o fato de atrair pessoas jovens e inexperientes. Nos estudos, as autoras identificaram que em diversos países, há de fato uma politica voltada para a Educação, porém, quanto mais complexa ela for, mais difícil será a sua implementação. No caso do Brasil, se não ficarem claras as regras de implementações dessas políticas, as metas e objetivos não serão cumpridos.
Para uma politica educacional ser bem sucedida é necessário que haja a adesão dos docentes a ela. Caso contrário, não se obtém exito. As avaliações externas, tem como finalidade garantir ao alunado o direito de aprender. Porém, é notório que os sistemas educacionais não tenham atingido os objetivos por conta da própria falta de estrutura do sistema. Contudo, nos últimos anos, a federação em todos os seus níveis tem tido preocupação com essa área e tem buscado implementar politicas que vão das avaliações à formação de docentes. Já é um grande avanço.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

A escola e o conhecimento na análise de Mário Sérgio Cortella:


Nos últimos anos, a mídia tem dado espaço a um filósofo que comenta, orienta e reflete diversos assuntos da contemporaneidade. Temas diversos são abordados, seja em entrevistas ou em comentários promovidos em jornais televisivos. Essa figura tão importante é Mário Sérgio Cortella, filósofo e escritor paranense que nos faz entender e pensar sobre muitas coisas.
Em seu livro "A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos", ele discorre sobre a crise da educação, crise essa que existe desde que a república foi implantada. Mas, de fato a crise se instalou quando a partir de 1964 (em tempos de ditadura militar), o país se abriu de fato ao capitalismo industrial, deixando de ser rural, tornando-se urbano e tendo as estruturas sociais ainda mais precarizadas. 
Como é de se esperar, saúde e educação foram as áreas que mais sofreram com as mudanças nas configurações da sociedade no pós-64. Tendo a necessidade de capacitar pessoas para trabalharem na indústria (e servirem ao capital), a Educação perdeu sua qualidade, já que muitas pessoas foram inseridas no sistema, tendo ele continuado o mesmo. Resultado: falta de estrutura, baixa qualidade na formação dos professores que passaram a ter seus salários diminuídos e as jornadas aumentadas, tendo consequentemente menos tempo de preparação das aulas. Até esses profissionais foram incorporados ao sistema de qualquer maneira.
Evidentemente, o sistema inchado, decaiu em qualidade. A excessiva quantidade de pessoas numa escola que não estava preparada para ela, não poderia gerar outra coisa senão a má qualidade. Para Cortella, esse dilema tem que ser resolvido pensando na equação quantidade e qualidade, gerando assim a democratização do acesso e da permanência. Um conceito por ele abordado, o apartheid social, ou seja, as escolas públicas de má qualidade geram as escolas privadas de boa qualidade e assim, os alunos oriundos das primeiras, tem seu destino praticamente traçado.
O grande desafio da Educação contemporânea, visto as causas da crise, é elevar a quantidade, mesmo com toda a quantidade que há no sistema. Cortella fala da necessidade de haver uma nova qualidade para uma nova escola, posto que a sociedade nascente (pós-ditadura) passa a exigir Educação como um dos aspectos da cidadania. Com a chegada dos trabalhadores nos bancos escolares, os desafios são outros. A própria Pedagogia pensada na academia torna-se insuficiente, muitas vezes. Outro conceito por ele abordado, o social darwinismo,  refere-se ao grande contingente de adultos analfabetos que simplesmente é ignorado pela Educação oficial ou é atendido de qualquer modo.
O autor ressalta a necessidade de se repensar a relação professor-aluno sob o viés da democratização, que deve ser estendida entre os pares e a própria gestão, gerando assim, a democratização do saber. Essa deve ser a busca e a razão de ser da Educação da classe trabalhadora, para que haja uma sólida base científica, formação crítica de cidadania e solidariedade de classe. Tais polos unidos, devem convergir para que os alunos possam ser donos do próprio conhecimento e livres na construção do saber, com professores que os estimulem e não imponha sobre si as suas vontades e autoritarismo, longe do pragmatismo que entende a educação da classe trabalhadora apenas como o ensino do oficio. Essa escola deve despertar principalmente, a cidadania, levando-os a entender e ter atitudes que visem transformá-la através dos interesses da maioria social.
Para se alcançar tais objetivos, é necessário que a nova qualidade social seja alcançada por uma reorientação curricular que leve em consideração a realidade dos alunos, levando-se em conta a riqueza e a diversidade cultural, mas dando-lhe uma orientação formal e científica. É preciso uma análise que vise observar aspectos políticos e epistemológicos do interior das escolas, para que os educadores não percam de vista o sentido concreto dessa sua ação.
Enfim, Mário Sérgio Cortella propõe repensar a Educação sob o viés da crise pelo qual ela passa, apontando caminhos que passam pela realidade cotidiana e não apenas pelas teorias que se esvaziam a medida que os teóricos se distanciam do chão onde a classe trabalhadora pisa.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Luiz Carlos de Freitas e a eliminação adiada:


Entre os autores de educação na contemporaneidade, um nome recentemente vem se destacando. Trata-se de Luiz Carlos de Freitas, doutor em Educação pela Unicamp que tem feito textos e análises bastante relevantes, matéria obrigatória a ser estudada para os concursos e que servem para a reflexão da prática docente no que se refere à avaliação. Sua abordagem se dá refletindo a cerca dos modos avaliativos presentes nas políticas educacionais (liberais) de FHC e Lula.
Em seu texto "Eliminação adiada: o ocaso das classes populares no interior da escola e da ocultação da (má) qualidade do ensino", o autor analisa as recentes mudanças ocorridas na educação e aponta que a esperança depositada no governo Lula no tocante a mudanças de percurso, no que se refere à educação, na prática convergiram para o mesmo projeto liberal de seu antecessor, FHC. A caminhada rumo a privatização do público e responsabilização por parte dos profissionais é a mesma.
Se o ensino superior as avaliações parecem caminhar no rumo certo, o mesmo não acontece com o ensino fundamental, que tem na Prova Brasil um mundo de incertezas. Neste caso, a avaliação promovida em parceria com estados e municípios tem muito mais interesse em prestar contas a sociedade, que de fato promover a melhoria no ensino.
Freitas afirma que os problemas da educação básica são fruto do projeto liberal hegemônico e ideológico. Se por um lado tais governos promoveram a universalização do ensino, por outro, o fizeram tendo como discurso a meritocracia e o empreendedorismo pessoal, ou seja, a igualdade é de acesso e de oportunidades, não de resultados. Ou seja, o sucesso depende unicamente de a pessoa se esforçar para tê-lo não lhe é garantido pelo Estado, por exemplo. Em sua análise, o autor busca conceitos de Marx (acumulação primitiva) e Bordier (ethos) para explicar que na realidade, eles não se aplicam a no sistema educacional brasileiro da contemporaneidade justamente por serem opostos ao que prega o liberalismo.
Se por um lado, o sistema nunca aceitará de fato sua real posição com relação a ideologia educacional, para não aceitar que de fato há desigualdades e mazelas diversas na sociedade, por outro, é visível e notório que esse projeto é falho. A progressão continuada, por exemplo, diminuiu os índices de repetência e evasão escolar, mas, na prática não tem aumentado o aprendizado dos alunos. Não reprovar não significa um aprendizado melhor.
O ocaso da educação, na analise de Luiz Carlos de Freitas é a saída dos alunos das escolas, seja por progressão continuada, aceleração, eja, etc. Os alunos saem das escolas, mas não preparados para enfrentar a vida. Tem seus estudos concluídos, para serem retidos mais adiante, nas seleções de empregos, nos processos seletivos, etc. As avaliações, são para responsabilizar os profissionais de educação pelo fracasso escolar e não o sistema. 
Freitas compara, assim, os sistemas de avaliação brasileiros aos empregados por políticas estado-unidenses da Era Bush e inglesas, Margareth Thather, por exemplo. A divulgação dos resultados das avaliações, além de responsabilizar as escolas, criou nesses países criou a politica dos “vouchers” - onde o governo paga para os pais colocarem os filhos em escolas melhores - transformando a educação em mercadoria.
Na Inglaterra e nos Estados Unidos, esse processo culminou com a feitura de um mercado capaz de solucionar o fracasso escolar. No Brasil esse processo vem avançando ano a ano, com empresas (ou institutos) que se dizem capazes de solucionar os problemas que geram o baixo aprendizado e assim por diante.
O fato é que de nada adianta se gastar milhões com empresas ou institutos que venham a "qualificar" a Educação, se não houver políticas que sanem as desigualdades sociais. O que gera o fracasso escolar é uma série de fatores somados que geram as desigualdades sociais e impedem o aprendizado efetivo por parte dos alunos. Escolas sem a estrutura adequada, com salas superlotadas, por exemplo. Entregar as escolas a lógica mercadológica não resolverá o problema, se de fato as estruturas continuarem as mesmas e o próprio INEP conhece essa realidade.
A meritocracia mascara o que existe realmente, ou seja, desigualdades sociais que geram dificuldade na implementação dos projetos pedagógicos. Essa linha gera uma serie e consequências positivas que podem ser bem aproveitadas pelo pensamento liberal.
Adiante, Freitas discorre sobre o conceito (por ele elaborado no inicio dos anos 90) de "eliminação adiada" ou seja, se o aluno não reprova na escola e ele não possui as condições avançadas de conhecimento, em algum momento da vida isso ocorrerá. É a exclusão sob uma nova forma. Sendo assim, as avaliações externas tornam-se cada vez mais excludentes, a medida em que medem o global, a média e não o individual. O aluno, continua solitário em meio as suas dificuldades e se estiver em uma turma com bom desempenho passará despercebido, se sua turma não for das melhores, também pouco poderá evoluir. Essas avaliações institucionais tem esvaziado o verdadeiro propósito que é medir conhecimentos e dificuldades dos alunos, para medir o sistema.
Responsabilizar o professor não significa acabar com as dificuldades do ensino. Isso é uma volta a visão da ditadura militar, que impunha uma estrutura verticalizada. Está aí a origem do tecnicismo e de equívocos que se fazem presentes até a atualidade.
Além disso, responsabilizar a escola gera a possibilidade de privatizar para resolver os problemas e cria uma outra estrutura em cima da já existente. Aquela que virá para solucionar o fracasso. Com isso, as pessoas em geral esquecerão as raízes de tudo. É evidente que as escolas falham, mas as politicas públicas também o fazem. 
Enfim, a visão de Luiz Carlos de Freitas está mais próxima a realidade de quem pisa no chão das escolas, do que dos teóricos, o mais importante é que em sua análise estão contidos muitos anos de estudo e grande embasamento teórico e filosófico.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Paulo Freire e sua pedagogia da autonomia:


Em se tratando de Educação Brasileira, um nome que sempre é lembrado é o nome de Paulo Freire, educador pernambucano que viveu no século XX e desenvolveu uma teoria educacional voltada à libertação. Seu trabalho se deu em torno da alfabetização de jovens e adultos. Compreensível esse seu interesse, num Brasil onde grande parte da população em idade economicamente ativa se encontrava analfabeta.
O último livro de Paulo Freire, intitulado de Pedagogia da Autonomia, versa sobre uma profunda reflexão proposta pelo autor ao professorado a respeito da autonomia que deve ser dada ao educando em situação de aprendizagem. Para Freire, a Educação tem a função de libertar o individuo, dando-lhe portanto, autonomia. Autonomia de pensar, agir e protagonizar sua História. 
No primeiro capítulo, o educador abre os trabalhos refletindo que não há docente sem discente, ou seja, o que dá sentido à carreira do professor é o aluno. Essa relação, no entanto, deve se dar pautada na crítica, o autor sintetiza seu pensamento ao dizer que "ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção".Em outras palavras, ele diz que o ato de ensinar não se reduz a despejar conhecimento sobre os alunos, ao contrário, é mostrar aos mesmos o caminho que aponte aonde está o conhecimento.
Adiante, ele diz que quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender, é uma relação onde há uma troca, não é feita de superior ou inferior, e sim de iguais, pois ambos são aprendizes. Na visão paulo-freiriana, a educação deve ser democrática. Ensinar-aprender gera a experiencia educacional em toda a sua plenitude. Contudo, ser democrático significa levar o educando a se colocar na posição de submisso, reforçando sua crítica e sua curiosidade. Deve-se levar uma problematização que gere um desafio a ser superado. O autor afirma que essas condições implicam ou exigem a presença de educadores e de educandos criadores, instigadores, inquietos, rigorosamente curiosos, humildes e persistentes. Isso produz a construção e reconstrução do conhecimento continuamente. 
Muito mais que conteúdos formais, o educador deve ensinar o educando a pensar certo. Sendo assim, não dá pra pensar numa Educação pautada na memorização, é preciso estabelecer relações entre o campo das idéias e o que de fato acontece no cotidiano. O professor precisa ser desafiador e, além disso, sair do mecanicismo da reprodução de produção acadêmica para a realidade, para lidar com a vida real. É necessário que o educador pense certo. E uma das condições necessárias a pensar certo é não estarmos demasiado certos de nossas certezas. Pensar certo, permite ao educando se enxergar como ser histórico, mais que isso, seu protagonista. 
Por fim, ele chama essa complexa relação de "dodiscência". Professor e aluno, ou nas palavras dele, educador e educando, se complementam e se necessitam para existir (realidade esta inegável).
Adiante, Paulo Freire diz da importância da pesquisa no processo aprendizagem: Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Isso se dá porque quem pesquisa o faz porque possui uma dúvida, quer de fato aprender.
Por fim, a Educação proposta por Paulo Freire é libertadora, que dê autonomia ao educando para que de posse do conhecimento ele possa agir na vida e não apenas se restringindo às formalidades da escola. O educador deve instigar, incentivar e provocar o outro a querer saber mais. Na visão paulo-freiriana, é uma relação de troca onde um não faz sentido sem o outro.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Edgar Morin e seus sete saberes necessários à Educação do Futuro:


A Educação tem sido o desafio de muitos pensadores na Era Contemporânea. No século XX, tempo de grandes turbulências, dadas as circunstancias politicas ocasionadas pela Primeira e Segunda Guerra Mundiais, que geraram uma nova configuração no campo social, político e econômico, não foi diferente. Além disso, houve a Guerra Fria que também trouxe muitas incertezas.
Para pensar a respeito da Educação, muitos pedagogos, filósofos, sociólogos, historiadores, entre outros, elaboraram pensamentos que chegaram até os nossos dias com tamanha força, que até hoje vem sendo discutidos no mundo acadêmico. Um desses pensadores que estabeleceu um importante pensamento a respeito da Educação e seu sistema, foi Edgar Morin, francês, intelectual com longa experiencia na carreira voltada às Ciências Humanas, que elaborou estudos voltados à epistemologia, ou seja, ao estudo das origens, métodos e da própria validade do conhecimento.
Se Morin se preocupava em entender a educação sob o viés da epistemologia, evidentemente, como fazê-lo em uma sociedade tão complexa como a ocidental, pós-moderna?  
Em seu livro, já na apresentação, o autor revela que os sete saberes, são na realidade, sete pontos esquecidos pelos governos em geral, são sete lacunas ou sete buracos negros. Ele os enumera e apresenta assim sua visão filosófica, na qual, em linhas gerais, propõe um ensino voltado para a interdisciplinaridade. Os sete saberes ficam assim elencados:

1. Conhecimento: embora seja esse o objetivo da educação, pouco se diz a seu respeito, o que é, o que significa. Conhecimento traz consigo erros e ilusões. Não é um espelho da realidade, ao contrário, é tradução de alguém, algo que vai sendo re-construído. 

2. Conhecimento pertinente: embora as disciplinas sejam importantes, todas elas se ligam de alguma forma, porém, nem sempre isso é perceptível. Se as disciplinas são visíveis, suas conexões são invisíveis. É preciso destacar a conexão entre elas e contextualizar os estudos, os dados, os conhecimentos, enfim. "Não se pode conhecer as partes sem conhecer o todo, nem conhecer o todo sem conhecer as partes".

3. Identidade humana: os cursos escolares esquecem do principal, a reflexão sobre quem somos nós. O homem é visto sob o ponto de vista de diversas ciências (biologia, psicologia, história, etc.), no entanto, não se procura decifrar a realidade humana. O individuo vive em sociedade (e a sociedade dentro dele), mas, o homem é uma espécie (homo sapiens). A essa relação, Morin deu o nome de realidade humana trinitária. O homem possui diversas dimensões: racional, jogador, ludens, economicus e mitologicus.

4. Compreensão humana: embora a compreensão seja fundamental em nossas vidas, não a ensinam na escola. Compreensão significa unir diversos elementos numa unica explicação. Para compreender, o homem usa toda a sua gama de experiencias. Os inimigos da compreensão são o individualismo, o egoísmo e assim por diante. O que gera a incompreensão é achar o outro inferior, a visão unilateral. a falta de inteligência da complexidade humana.

5. Incerteza: a escola transmite conhecimentos provados, aparentemente prontos, cheios de certeza. Contudo, até as ciências mais exatas possuem suas dúvidas, na natureza, as catástrofes demonstram que nem tudo ocorre como o esperado. Existe o imprevisível, porém, nem sempre ele é negativo, ele pode gerar a coragem que leva a superação.

6. Condição planetária: a conexão entre todos os países do mundo, hoje ela é chamada de globalização, mas esse processo teve inicio lá no século XVI com a colonização da América. Não apenas os homens estão conectados, mas as tecnologias, as informações e assim por diante. A expansão mundial e a conectividade, no entanto, não tem conseguido impedir que o homem degrade o seu habitat, o planeta onde vive. É necessário conscientizar da importância de cuidar do planeta.

7. Antropo-ético: reflexão a cerca dos problemas de moral e ética que embora sejam diferentes entre as culturas, existem em todas elas. Democracia nunca é absoluta. Transmitir a consciência social leva a cidadania e o individuo a exercer sua responsabilidade (social). As OnGs desenvolvem essa responsabilidade social. 

A intenção de Edgar Morin ao escrever sobre os sete saberes, não foi mudar os programas ou currículos educacionais. Ao contrario, ele pretendia que esses saberes fossem incorporados às estruturas já existentes, produzindo assim uma reflexão importante: em que mundo vivemos e quais heranças iremos deixar. Os sete saberes são fruto de uma educação que se conecta, contextualiza, insere valores humanos e procura entender o homem em toda a sua essência
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